Resenha- A Redoma de Vidro
(Esse post tinha sido feito para o extinto site Parada Literária, assim como o Dom Casmurro. Portanto, algumas resenhas eu transferi de lá).
Atenção: Esse texto possui spoilers. Leia por sua
própria conta e risco.
Algo me
impediu de escrever sobre um dos livros que mais gostei de ler até hoje, mas
não saberia explicar o porquê. No entanto, talvez por ele ser um tipo de leitura
complexa. Não que a história possua palavras arcaicas, frases sem nexo ou até
mesmo uma tradução mal feita, mas é aquele tipo de história que, se você não
compreende ou se esforça para compreender os sentimentos da personagem, o livro
se torna chato e cansativo após algumas páginas.
A Redoma de Vidro é também complexo pelo seu próprio formato, a
autobiografia. Para alguns, escrever sobre a própria vida é algo fácil, pois,
afinal de contas, é falar sobre seus passos, como uma linha do tempo. Mas, esse
livro é muito mais do que isso. Trata-se de uma personagem que possui
sentimentos que, dessa forma clichê mesmo, não cabem nesse mundo tão veloz cada
vez mais e tão distante de sua mente.
"Às
vezes sonho com uma árvore e essa árvore é minha vida"
Sylvia Plath não era uma romancista e sim uma poetisa.
Durante alguns anos, até a sua morte, ela publicou alguns de seus poemas. A
autora sofreu de depressão durante alguns anos e A Redoma de Vidro foi como um
diário, porém na pele de outra personagem: Esther Greenwood, uma
jovem estudante que recebe uma bolsa de estudos em Nova York.
Embora seja muito dedicada e
responsável, Esther tem dificuldades em se focar e se sentir bem como as outras
pessoas. Ela vive em uma época em que a mulher estava cada vez mais se
inserindo no mercado de trabalho e não sabia se escolhia entre seus estudos e a vida pessoal, ou seja, o matrimônio. Após
algum tempo, ela descobre que tem depressão.
Eu via minha vida se ramificando à minha frente como a figueira verde daquele conto.Da ponta de cada galho, como um enorme figo púrpura, um futuro maravilhoso acenava e cintilava. Um desses figos era um lar feliz, com marido e filhos, outro era uma poeta famosa, outro, uma professora brilhante [...]Me vi sentada embaixo da árvore, morrendo de fome, simplesmente porque eu não conseguia decidir qual figo eu ficaria. Eu queria todos eles, mas escolher um significava perder todo o resto, e enquanto eu ficava ali sentada, incapaz de tomar uma decisão, os figos começaram a encolher e ficar pretos e, um por um, desabaram no chão aos meus pés.
Esther começa a entrar em sua própria
redoma e vários pensamentos de insegurança, indecisão e confusão mental começam
a aparecer, enquanto sente a pressão de ser uma pessoa bem sucedida no futuro
ou uma boa mãe e esposa. Depois de algum tempo de tortura mental diária, a
garota resolve que desaparecer do mundo é a melhor solução. Ela quer, tenta,
mas não consegue ficar consigo mesma, mesmo que seu inconsciente peça por
socorro.
'"Deveria
ficar tão animada quanto a maioria das garotas, mas não conseguia"
Quem já leu o livro- ou não- e quem
já passou por essa situação, como a depressão, entende ou entenderia o que a
própria autora passou. Como já havia mencionado, uma dificuldade para escrever
uma história não-linear como esta requer uma delicadeza diferente, porque
colocar sentimentos depressivos precisa de uma coragem, de bem lá de dentro. A
personagem se envolve com várias pessoas que, por mais que tentam ajudá-la, ela
se recusa e, ao mesmo tempo, se sente sozinha na multidão.
Ao longo da
história, Esther tenta se autodestruir várias vezes, como cortar os pulsos e
tomar diversos narcóticos.
É curioso como no fim a personagem
entra em uma sala para não saber se vai ficar bem ou não. Como foi uma quase
autobiografia de Sylvia e escrito quase no fim de sua vida (a autora se
suicidou tomando uma série de narcóticos e colocou a cabeça no fogão, ligando o
gás), logo podemos supor que a própria autora não sabia se iria sobreviver e
destruir sua redoma ou acabar em um fim trágico, o que realmente aconteceu no
final de sua própria história.
Os personagens, algumas vezes,
parecem não possuir alguma importância na história, mas possuem. Eles são a
visão que Esther tem do mundo, como Buddy Willard, um antigo interesse amoroso
de Esther antes mesmo de ela entrar em depressão e que ela insiste chamar de
hipócrita. Na verdade, para ela, a maioria das pessoas são falsas e e
hipócritas, coisas que ela pensa, pois ela já entrou uma intensidade muito
grande de si mesma, então, tudo o que ela sente, é mais profundo do que
qualquer outro sentimento ao seu redor.
Mais curioso ainda é como para uma
parte do mundo esse livro fez tanto sucesso e para uma outra parte, nem tanto.
Por exemplo, um trecho do livro é muito conhecido por seus fãs, que o tatuam na
pele "I Am, I Am, I Am". Eu concluo que é um livro muito bom de se
ler- isto é, se você tiver prazer nesse tipo de leitura, extremamente profunda,
de uma pessoa que tenta se encontrar do início ao fim.
Eu respirei fundo e ouvi a velha pancada do meu coração. Eu sou, eu sou, eu sou- Página 199
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