Ao vencedor as batatas
Samuel era um sujeito
que sempre dizia à seus companheiros no bar.
-Nunca, mas nunca me
casaria.
-Tens tantas noivas
por que, então?
Ele fumava, então, um
charuto e soprava para o céu e dizia, despreocupado, com a malícia entre os
dentes.
-Ninguém consegue
beliscar debaixo da saia de graça, amigo.
O bom sujeito, aos
olhos dos pais das moças, tinha esse lema desde sempre. Enlouquecia a mãe de
desgosto e de amores por suas bonecas. As noivas de Samuel nunca moravam na
mesma cidade, eram cada uma de um lugar. Quando os pais apressavam o
matrimonio, Samuel tinha desculpas nas mangas. Ninguém fora tão severo como o
pai de Lurdes. A pequena sonhava em vestir o véu de noiva e ser somente do
rapaz.
Tudo o que havia sido
ensinado pelos pais da menina, Samuel a desaprendera. Colocava-lhe discos de
vinis para tocar, tocava debaixo de seu sutiã dentro do carro à noite e dizia
coisas que somente um homem casado poderia dizer à sua mulher, dentre quatro
paredes.
No fim de tudo o que
havia de safado, Samuel se entregava à gandaia no finzinho da noite. Ele
levantava o nariz e dizia à seus amigos, enquanto jogavam sinuca.
-Se mulher é santa, é
passar em minhas mãos que eu mostro que não é. Logo se desvirtua, é batata!
Seus amigos mais
sérios afirmavam que não. Afinal, suas namoradinhas e noivinhas nunca os
trairiam.
-Certeza de mulher
fiel até posso ter, mas de imaculada e puritana, está para nascer uma- E logo
emendava, ao ver o rosto de espanto dos homens- Não fiquem assustados. Mulheres
podem ceder para um homem só a vida toda, já o oposto eu nunca vi.
Lurdes quase lhe
enjoava aos poucos. Os mesmos olhos, as mesmas pernas branquinhas e suaves, a
mesma previsibilidade quando havia toque não havia mais sabor. O problema era o
coroa, que sempre o tinha como desconfiança, ainda mais ao saber que algumas
mocinhas de família, tão puras e corretas não se casaram por desculpas do bom
moço.
Em não muito tempo,
uma família se mudara para São Paulo e junto dela, uma caçula de dezoito anos,
moreninha e de olhos da mesma cor que os cabelos. Costumava usar saias rodadas
de bolinhas e com os ombros branquinhos descobertos. Andava com graça e, ao
mesmo tempo, introvertidamente. Não demorou muito para Samuel perguntar seu
nome. Cecília. Parecia tão santinha.
Alguns rapazes
solteiros já colocavam olhos sobre a pequena. Para marcar seu território,
rapidamente, Samuel os afastavam.
-Estou saindo com
Cecília.
-E sua noiva?
–Perguntava seu amigo Bezerra.
-Larguei-a.
-No duro?
-No duro. Muito
enjoada. Cheia de frescuras.
O que não era
totalmente verdade. Conseguiu, com muito esforço, adiar a data do casório. Por
mais que Lurdes fosse ciumenta que só, ela tinha seus encantos. Mas não tanto
quanto Cecília. Ela o ignorava. Indiferente, era meio solta e meio dura. Samuel
afirmava com toda a certeza à Bezerra.
-Esse brotinho vai
ceder, um dia.
-Acho que está
apaixonado.
-Não confunda nada do
que eu digo ao amor, Bezerra. Nem sei o que é isso.
Bezerra desconfiava,
mas era verdade, Samuel não estava apaixonado. Nada sentia além de vontade de
provar que ela cederia. Com algumas insistências e análise de perfil da menina,
ela cedia, mas muito pouco. Logo, percebera que ela não queria nada além do que
um homem só em sua vida, da maneira que demonstrava. Já era certeza de que suas
teorias sobre as mulheres eram assim.
Andava com as duas
meninas, uma às segundas, quartas e sextas e a outra, às terças, quintas e
sábados. Bezerra o aconselhava, mas não queria saber.
-Não tem medo, homem
de Deus?
-Medo de que, ora
bolas? De me traírem? –E ria-se no sofá da casa de Bezerra.
-Que diabo! Acha que
a cidade é tola? E se te pegam?
-Morro feliz.
Samuel não aceitava
quando o amigo lhe dizia para desistir. A pequena não ia lhe ceder, jamais. Não
até eles se casarem.
-Não mesmo! Já provei
metade da teoria, pensa só na outra metade.
Certa noite,
conseguiu tocar-lhe debaixo da saia. Sem desabotoá-la, dentro do carro e em um
lugar em total breu, a fez ceder. Fácil assim.
-Ao vencedor, as
batatas- Pensou ele.
E contou à todos os
colegas, o feito. Se sentia o maior vencedor. Tão frágil e ingênua, talvez
tivesse uma vontade que somente a paciência de Samuel a fez tranquilizar-se. Em
um dia bonito como a consciência de Samuel naquele instante, seu amigo Bezerra
logo bateu-lhe na porta. Era pra dizer que Cecília de boba não tinha nada.
-E você ainda tinha
dúvidas? –Disse Samuel- Falei, falei mesmo. Pode-me dar tapinhas nas costas, eu
lhe disse primeiro que todo mundo.
-Não é essa
ingenuidade que eu venho lhe trazer, Samuel.
E contou-lhe que a
heroína não lhe cedia, unicamente, mas para dois ou três mais.
-Está maluco –E,
assim, dava-lhe de ombros Samuel.
Outra noite qualquer,
andando por uma rua bastante iluminada e deserta, Samuel encontrou duas
silhuetas aos abraços e beijos em uma rua sem saída. Era Cecília e um rapaz do
botequim.
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